O ano era 1971, época em que o Brasil vivia em pleno regime militar, e as TVs abertas levaram ao seus espectadores uma grande gira de umbanda comandada pelo Exu “Seu 7 da Lira” através de sua médium, Cacilda de Assis.

A entidade ganhou destaque na mídia brasileira ao participar ao vivo nos programas do Chacrinha, na TV Globo, e de Flávio Cavalcanti, na TV Tupi, com sessões que causaram alvoroço e muita polêmica!

“Logo em seguida, no dia 29, último domingo de agosto [de 1971], aconteceu o episódio que mexeu de vez com a suscetibilidade e os brios dos partidários da censura. A disputada mãe-de-santo Dona Cacilda de Assis (que dizia receber o espírito do ‘Seu Sete da Lira’, um exu da Umbanda) transformou os estúdios da Globo e da Tupi em verdadeiros terreiros de espírita. ‘Embora as apresentações diferissem,’ relatou o Estado de São Paulo (3 Set. 1971, 4), ‘o espetáculo em si foi o mesmo: os umbandistas de ‘Seu Sete’ invadiram o palco (baianas, cantores, pessoas bem vestidas, em ‘relações públicas’…) num tumulto indescritível.’ A Censura qualificou a apresentação de ‘Seu Sete’ de ‘baixo espiritismo, exploração da crendice popular e favorecimento da propaganda do charlatanismo’; a Igreja [Católica], por intermédio do secretário geral da CNBB, declarou que a ‘inclinação à transcendência do povo brasileiro’ estava sendo utilizada por ‘indivíduos sem escrúpulos, em atividades pseudo-religiosas’ (Jornal da Tarde, 3 Set. 1971; apud Mira, 1995, 36).”

Como se pode ver neste depoimento publicado no Jornal da Tarde, a participação do ‘Seu Sete da Lira’, através da Mãe Cacilda, nos programas de TV deu o que falar!

Quem presenciou a cena disse que as pessoas na plateia desmaiavam. Os câmeras e contrarregras passavam mal. As chacretes se contorciam e davam ruidosas gargalhadas, aparentemente incorporando pombas-giras. Jornais e revistas só falavam no Exu que estremeceu o público e alavancou a audiência das TVs.

Na época, disseram que até a então a primeira-dama D. Scylla Médici, esposa do presidente Emílio Garrastazu Médici, teria mergulhado em transe, enquanto assistia ao programa.

Cacilda de Assis enfureceu generais e católicos com a “macumba na TV”, como se referiam eles no tabloide paulistano Notícias Populares. Em meio à polêmica, a Censura Federal solicitou a suspensão, por oito dias, dos programas de Chacrinha e Flávio Cavalcanti. A possibilidade de uma intervenção estatal mais severa levou Walter Clark, diretor-geral da Globo, e Almeida Castro, diretor artístico da Tupi, a se reunirem. O resultado desse encontro foi a assinatura de um protocolo destinado a eliminar as atrações “de mau gosto” das grades de ambas as emissoras.

Até mesmo o próprio Chacrinha, que era brincalhão e fazia piada com todos, ficou sem ação, conforme o relato do professor Paulo Duarte: “(…) me causou espanto, assistir, há dias àquele espetáculo de ‘Seu Sete’, apresentado como se fosse um retrato do Brasil: uma ‘mandingueira’ de cartola e charuto, espargindo cachaça pela multidão em transe, como um sacerdote o faz com água benta. Um adolescente entrou para colaborar, quando foi ‘tomado’ diante da Mãe de Santo. Esta, que já bebera em público largos goles de pinga, esborrifou-lhe o rosto com um pouco da bebida, aos efeitos mágicos da qual o moleque voltou à razão em meio ao alvoroço da multidão, sob o patrocínio de um Chacrinha mais inconsciente que legítimo”.


Seu Sete da Lira, um Exu que curava

Apesar de toda a polêmica causada nos programas de TV, Seu Sete também ficou muito conhecido pelas inúmeras curas que realizava nas suas sessões, que eram realizadas no Terreiro disputadíssimo de Mãe Cacilda, localizado no bairro de Santíssimo, zona oeste da cidade do Rio. 

As suas sessões de atendimento, realizadas nos sábados à noite, chegavam a reunir até 20 mil pessoas, que iam em busca de cura para os seus males.

Essas pessoas participavam das “mesas de cura”, onde o Exu caminhava, espargindo cachaça nos assistentes. Diversos eram os fiéis que se diziam curados de doenças, até mesmo o câncer.

Um dos momentos mais esperados pelos fiéis era o “Pino da hora grande”, que ocorria exatamente à meia noite, momento em que seu Sete realizava as preces e convidava os fiéis a realizarem um auto exame de consciência, sempre dizendo “Olhem para dentro de si mesmos”. Essa auto análise, muitas vezes revelava defeitos que seus fiéis reconheciam que só lhe davam prejuízos, acarretando os males que lhes afligiam.

Há relatos de que, durante as sessões, o Seu Sete chegava a consumir de 40 a 60 litros de cachaça e 16 caixas de charutos. Entretanto, ao desincorporar, Mãe Cacilda não tinha qualquer vestígio do uso do álcool e fumo, sendo que ao final dos trabalhos permanecia tão normal e calma como quando no início. As sessões duravam, em média, de 12 a 14 horas. 

A bebida era uma importantíssima ferramenta de trabalho do Seu Sete, pois era utilizada  como um dos elementos para a realização das curas e descarregos.

Cacilda morreu aos 92 anos, de causas naturais, no dia 21 de abril de 2009 e, após a sua morte, o Terreiro foi desativado pois, segundo informações, não havia ninguém preparado para dar continuidade ao trabalho. Hoje, no lugar, há um condomínio residencial, mas dizem que a tronqueira permanece erguida aos fundos do terreno. 


Fontes:

O Fenômeno Seu Sete da Lira – Cacilda, a médium que parou o Brasil”, de Cristian Siqueira.

Seu Sete da Lira – Wikipedia

Fernanda Correia

Sobre Fernanda Correia

Jornalista, astróloga e editora do Eleve-se. Capricorniana com Ascendente em Touro, ama tudo que faz conexão com a terra e está sempre disposta a aprender. É uma eterna pesquisadora de temas como astrologia cármica e espiritualidade.